Federação das Empresas de
Aqüicultura de Santa Catarina
MANIFESTO DA FEDERAÇÃO DAS EMPRESAS DE AQUICULTURA DE SANTA CATARINA (FEAQ) CONTRA A CONSTRUÇÃO DO ESTALEIRO
A MARICULTURA
A MARICULTURA de Santa Catarina concentra 90% da produção nacional de moluscos cultivados. As baías norte e Sul da Ilha de Santa Catarina são responsáveis pela produção de 90% das ostras e 60% dos mexilhões do estado.
A MARICULTURA de Santa Catarina ocupa 786 famílias, totalizando 3930 pessoas envolvidas diretamente na produção (o maricultor e mais quatro familiares ou empregados) e indiretamente mais 9mil pessoas a montante e a jusante, da cadeia produtiva da malacocultura, totalizando mais de 12930 pessoas (EPAGRI-2005).
A MARICULTURA de Santa Catarina em 2009, com o número atual de produtores, proporcionou uma movimentação financeira bruta estimada em R$ 21.606.609,00 para o Estado (EPAGRI2010).
Das áreas destinadas á produção marinha atualmente, somente 50% são utilizadas. Com 100% de utilização, teremos a geração de mais de 12.930 postos de trabalho, gerando uma renda adicional de R$ 21.606.609,00 de renda aos bolsos dos catarinenses, dos maricultores, dos fornecedores de insumos e equipamentos, dos restaurantes e bares, das companhias aéreas etc. O mercado internacional está ávido por moluscos brasileiros, face aos problemas de mortalidade de ostras na costa francesa e o derramamento de óleo no Golfo do México. O desenvolvimento de técnicas de cultivo e de equipamentos adaptados às condições brasileiras, bem como a desenvolvimento de sistema de cultivo de novas espécies como o polvo, as macroalgas, o bijupira na piscicultura marinha, a produção de apetrechos e embarcações, o desenvolvimento da gastronomia local voltada para os frutos do mar (restaurantes) e o desenvolvimento do turismo, compõem um quadro favorável ao desenvolvimento integral de uma cadeia produtiva, onde todos os envolvidos no processo poderão ser diretamente beneficiados. Podemos usar como exemplo o desenvolvimento acontecido na comunidade do Ribeirão da Ilha, onde turismo, gastronomia foram estimulados pelo desenvolvimento da maricultura na região.
O projeto aqui denominado “estaleiro de Biguaçu” prevê a instalação do maior complexo de construção de navios para transporte de petróleo e de estrutura para exploração de petróleo do Brasil numa das regiões mais sensível da costa brasileira. Sensível por causa da ameaça à maricultura e a pesca artesanal e suas repercussões econômicas, mas também por ser esta uma região de transição entre as regiões mais frias e as mais quentes do continente e abrigar uma série de ambientes e habitats extremamente sensíveis á ações antrópicas.
Os maricultores conhecem os riscos da poluição industrial sobre a produção aquícola. O Laboratório do Instituto de Ecodesenvolvimento da Baía da Ilha Grande (IED-BIG), instalado nas proximidades de três estaleiros na baia de Angra dos Reis (RJ) tem problemas para produção de sementes de moluscos por causa da poluição com metais pesados lançados ao mar na região. A baía de Babitonga, localizada no norte do Estado, está ameaçada pela poluição do porto de São Francisco. Sabe-se também que as áreas portuárias são geradoras de dejetos e de poluição, sendo consideradas as áreas de maior concentração de poluentes na zona costeira pelo mundo a fora.
A água de lastro de navio tem sido estudada profundamente em vários países produtores de moluscos por ser apontada como responsável pela dispersão de espécies invasoras em ambientes costeiros assim como transmissão de doenças de espécies aquáticas. Nos portos e aeroportos é proibida a entrada de vegetais e animais sem atestado sanitário devidamente autorizado. É proibida a entrada de sementes de ostras de outros países para impedir a disseminação de doenças em nossas águas de cultivo e a água de lastro constitui-se num grande risco a aqüicultura.
As constantes dragagens previstas na baía Norte interferirão drasticamente na quantidade de material em suspensão na água, reduzindo a luminosidade, afetando a disponibilidade de alimentos fotossintetizadores como a s algas, que são alimento para os moluscos.
A hidrodinâmica das baias é condicionada pela circulação geral das correntes marinhas da plataforma continental da região sul e sudeste do Brasil, assim comopelas condições atmosféricas, através dos ventos e circulação de maré. Pesquisas recentes demonstram que as águas do Rio da Prata, que separa a Argentina do Uruguai, interferem na temperatura e na salinidade das águas da plataforma continental brasileira do sul e sudeste, alterando as condições de produção de moluscos em Florianópolis e região. Qualquer problema de poluição gerado nos estaleiros poderá ser facilmente dispersado dentro das baías, responsável por 60% da produção de moluscos do Estado.
A carência de séries temporais de dados oceanográficos sobre a região em estudo, tornaria qualquer conclusão sobre a hidrodinâmica dentro das baías precipitada. Estudos como este deveriam conter series temporais de no mínimo um ano, expressando as variações anuais das condições atmosféricas e das correntes. Houve tempo para aquisição e manipulação dos dados para chegarem a tais conclusões? Os maricultores e pescadores sabem que ventos nordeste que sopram durante a primavera e verão podem ser constantes, de forte intensidade e de longa duração durante este período. A dispersão de um derramamento de óleo ou água de lastro de navio seria muito rápida e devastadora para a produção de moluscos. No caso de vento sul, as famosas frentes frias que tem capacidade de alterar rapidamente as condições de corrente superficial das águas e poderia dispersar poluentes pelo norte do estado, afetando a produção de moluscos e a pesca artesanal.
Além do aumento do material em suspensão na água, nos sedimentos de fundo da baía foi identificada uma concentração maior de arsênio, que pode ser colocada em suspensão na coluna d’água e afetar a qualidade dos produtos da aqüicultura. O arsênio está presente na água do mar, nos pescados e moluscos, mas concentrações altas podem levar problemas como: conjuntivite, hiperqueratose, hiperpigmentação, doenças cardiovasculares, distúrbios no sistema nervoso central e vascular periférico, câncer de pele e gangrena nos membros nas pessoas que os consumirem.
Em adição, o RIMA apresentado pela empresa é muito superficial sobre os aspectos que tratam da maricultura: inicialmente, a área de influência do projeto não inclui a baía Sul; O RIMA minimiza os impactos da implantação do estaleiro à necessidade de “realocação de algumas linhas de cultivo de áreas de maricultura próximas ao local do empreendimento, com autorização pelo PLDM; a utilização de barreiras flutuantes (cortinas de silte) no entorno das áreas de cultivo, em forma de “U”, formando uma barreira entre as áreas de cultivo e a dragagem; utilização de draga de sucção e recalque, que serão usadas nas áreas mais rasas e que provocam mínima ressuspensão de sedimentos do fundo, entre outras. Está previsto, ainda, o desenvolvimento de projetos de apoio à atividade de maricultura, de forma participativa.”
Entretanto as conseqüências sobre a maricultura e a pesca podem ser muito mais profundas e irreversíveis do que o empreendedor aponta, sendo necessário o levantamento dos dados complementares do RIMA antes da sua implementação, já que os riscos de comprometimento da qualidade da água são enormes. É necessário estimar o volume e a qualidade dos poluentes a serem produzidos, a localização da sua disposição no meio ambiente, e quais as medidas necessária para impedir o seu lançamento para o mar, considerando que estas águas são usadas para a produção de alimentos.
Além disso, os riscos para a alteração da paisagem são muito grandes, com as dragagens, instalações industriais e enormes embarcações, destoando do contexto paisagístico, o que certamente prejudicará a atividade turística, que nesta região, está vinculada à qualidade ambiental, à maricultura e à pesca artesanal Diante das razões apresentadas a cima a Federação as Empresas de Aquicultura de Santa Catarina – FEAQ, se manifesta em apoio a parecer do ICMBio, que questiona o RIMA apresentado pela empresa e nega a autorização para licenciamento ambiental.
Florianópolis 21 de julho de 2010
Fabio Faria Brognoli, Presidente da Federação das Empresas de Aquicultura de Santa Catarina – FEAQ (entidade congrega as empresas que produzem e beneficiam moluscos no Estado de Santa Catarina).
EPAGRI (2005) Oliveira Neto, Francisco Manoel, Diagnóstico do cultivo de moluscos de Santa
Catarina, 2005. Série documentos 202, Epagri-SC.
EPAGRI (2010). SANTOS, A. A.dos et alli. Maricultura: Mexilhões, Ostras e Vieiras
Síntese Informativa da Maricultura. Epagri/Cedap. Florianópolis, junho de 2010.
Disponível no Site da Epagri.
Nenhum comentário:
Postar um comentário